COVID-19 – O que há de novo?

O número de casos continua a aumentar. A 1 de Março, foram reportados 87 137 casos confirmados e 2 977 mortes, estando 90% e 97%, respectivamente, registados na China. A epidemia expandiu-se para todos os continentes, excepto Antártida, envolvendo 58 países, tendo, agora, a Organização Mundial de Saúde (OMS) considerado o risco, a nível global, de muito alto.

A maioria dos doentes com COVID-19 são adultos, e apenas 2,1% com idades inferiores a 20 anos. Apesar de se desconhecer, ainda, muitos detalhes da sua origem e da sua capacidade de se transmitir homem-a-homem, cada vez mais casos parecem estar associados à propagação inter-humana.

SARS-CoV-2 é o terceiro coronavírus, que, nos últimos 20 anos, tem posto as instituições de saúde pública e a própria OMS em alerta máximo. A síndrome respiratória aguda grave por coronavírus (SARS-CoV-1) e a síndrome respiratória do Médio Oriente por coronavírus (MERS-CoV) parece terem sido mais patogénicas do que a SARS-CoV-2, responsável pela doença denominada COVID-19, aquelas com uma mortalidade de 9,5% e 34,4%, respectivamente, em comparação com a mortalidade que é assumida para COVID-19, que se situa entre 2% e 4%.

A transmissibilidade eficiente entre humanos correlaciona-se com a propagação a larga escala do vírus, mas a gravidade da doença é um factor indirecto, que interfere na capacidade da sua disseminação. No caso do SARS-CoV-2, com os dados disponíveis até à data, cerca de 80% dos infectados está assintomática ou evolui com poucos sintomas, cerca de 14% apresenta doença grave e 5% de doentes críticos, em que a mortalidade é de cerca de 50%. A evolução da infecção para doença grave está associada à idade (com mais de 60 anos) e com comorbilidades, em particular, doença renal e diabetes.

Apesar de se desconhecer, em rigor, a dimensão da transmissibilidade entre humanos, é seguro admitir que, se o vírus se transmite com facilidade e parecendo ter menor patogenicidade do que SARS-CoV-1, pode ter maior capacidade de propagação em larga escala. Deste modo, um vírus que está associado a maior gravidade do ponto de vista individual, tem o potencial de maior risco para a saúde pública, dada a maior dificuldade de identificação dos infectados (a maioria com evolução subclínica ou com um quadro clínico de menor importância).

A maioria dos casos de SARS-CoV-1 e de MERS-CoV esteve associada a transmissão nosocomial, em particular devido a procedimentos médicos geradores de aerossóis, que ocasionaram grandes surtos, em estabelecimentos de saúde. Deste modo, SARS-CoV-2 que, do ponto de vista clínico, pode passar despercebido por não evoluir com gravidade em indivíduos saudáveis, pode ser de risco significativo em populações vulneráveis, como os idosos e/ou com comorbilidades, como os diabéticos e/ou aqueles com doenças cardiovasculares.

Vírus mais patogénicos, como SARS-CoV-1, de transmissibilidade inter-humana fácil, podem ser melhor controlados, pela vigilância sindrómica (febre) e pelo rastreio dos contactos, ao contrário daqueles menos patogénicos, como parece ser o caso de SARS-CoV-2, em que a gravidade da doença é menor, o que torna mais difícil a capacidade de controlo da sua propagação.

A OMS estabeleceu objectivos estratégicos para a interrupção da cadeia de transmissão entre humanos, reduzindo infecções secundárias entre contactos próximos e trabalhadores da área da saúde, evitando eventos de transmissão amplificada e prevenindo a transmissão transfronteiriça.

Estão em curso ensaios clínicos que estão a analisar diversas intervenções terapêuticas, incluindo o ritonavir/lopinavir e o remdasivir (um análogo nucleotídeo desenvolvido pela Gilead Sciences, que mostrou actividade contra diversas infecções víricas, como, por exemplo, Ébola e coronavírus, como MERS e SARS).

A título individual, contra o risco de propagação da infecção por SARS-CoV-2, as medidas a adoptar passam pelas boas práticas de higiene das mãos e respiratória, com lavagem das mãos (≥ 20 segundos) com água e sabão, antes de tocar nos olhos, no nariz e na boca e, ainda, antes e após a preparação de alimentos e antes das refeições e tossindo e espirrando para lenços de papel (não reutilizáveis) ou para o braço com o cotovelo em flexão, evitar as deslocações para regiões de transmissão activa de SARS-CoV-2, na comunidade e aqueles que se deslocaram a estas regiões devem estar atentos ao aparecimento de sintomas (febre, tosse ou dificuldade respiratória) e nunca recorrerem como primeiro recurso a um estabelecimento de saúde, sem contactar antes a linha Saúde 24 (808 24 24 24) e, nos 14 dias após o regresso, promover um distanciamento social responsável.

Francisco Antunes
Professor catedrático jubilado da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa
Especialista em Doenças Infecciosas
Líder do grupo de investigação “Ambiente e Doenças Infecciosas” do Instituto de Saúde Ambiental da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa